23 de setembro de 2021

Encurralados

 

Encurralados - Por LR.





A fila está imensa.

Todas aquelas pessoas são de um bom poder aquisitivo. Estão sempre à caça de diversões, passeios, aventuras, compras. Conhecem muitos lugares, viajam por várias partes do mundo. Em sua bagagem levam certa cultura adquirida enquanto visitam os diversos países e se admiram e se entusiasmam ao descobrir as diferentes pessoas, os diferentes costumes, línguas e construções. As obras que perseguem em suas visitas aos museus que nunca podem ser deixados de lado, enriquecem seus olhos deslumbrados ao se deparar com artistas de renome, famosos por suas artes, histórias pessoais, seu passado, seus dons.

Daí que sempre na frente desses museus, as praças são sempre tomadas de manhã e à tarde, no horário estabelecido para visitas, pelos turistas ávidos para ver e se maravilharem, e são invadidas as bilheterias, sendo-lhes indiferente que fiquem horas a fio esperando a sua vez, mas depois que compram seu ingresso, está seguro que irão ver, e que certamente ninguém impedirá a sua passagem para o recinto fechado, para os corredores, e enfim, para as escadas que levam ao interior dos museus.

Agora ali, este estava sendo mais uma vez visitado. Com muito interesse, todas aquelas telas que estão dependuradas ao longo das paredes são contempladas com pasmo, e os olhos depois de observarem todo o conjunto, agora se apegam ao seu colorido, aos detalhes, lê-se o nome da obra e do autor, o ano, o século a que pertence. Às vezes, telas enormes tomando toda a extensão da parede, ora menores, são apreciadas da mesma maneira, e quando os olhos estão desviados destas telas observam o piso, as paredes e o teto, também adornados com a mesma arte, a mesma delicadeza de detalhes, e sempre com o mesmo requinte que se exige de um museu famoso.

Aqueles turistas ficam também embevecidos diante das esculturas que ornam os salões, com todas aquelas estátuas de mármores esculpidas e retratando mil e um personagens em várias posições, bustos de pessoas famosas que há muito estiveram aqui e ficaram escritas na memória dos povos pelo que representaram.

Assim a visita a esses salões, onde também há uma infinidade de coisas expostas como roupas, armas, instrumentos musicais antigos e objetos encontrados em sítios arqueológicos, excitam a curiosidade dos visitantes e os levam a crer que o homem adora juntar seus cacos depois de destruí-los.

Aquele grupo de turistas ou todos que têm saído de tão longe, de um país distante ou da própria cidade onde se situam os museus, anotam tudo o que lhes interessam, já que lhes é proibido fotografar e filmar no seu interior.

Sempre na saída, compram-se os postais que lhes proporcionam, mais tarde, rever as obras que mais gostaram, e guardá-las de recordação em um álbum. Mas, eles no momento, só as observam com curiosidade e registram por escrito ou na memória.

Detém-se de repente mais uma vez frente a uma grande tela pintada a óleo por um artista famoso.

Aqueles tons de verde, azul e castanho da paisagem onde se situa um grande bosque ao fundo, onde se entranhando nele está uma estrada alaranjada e ao fundo umas casinhas, retrata bem uma cena rural. Lá do lado da estrada há uma lagoa, e ali bem no começo da estrada, há uma pessoa. É uma mulher. Usa saia branca, blusa vermelha. Trás os cabelos em trança, pois, só se consegue vê-la pelas costas, e carrega na mão uma mala de viagem. Parece dirigir-se para sua casa, lá longe. Denota-se pela direção que a estrada segue e pelo seu andar. É um quadro bem bonito, onde o contraste das cores que predomina na paisagem faz com que ela tenha um quê de nostálgico. Lá no lugar onde estão as casinhas, ao longe, se vê alguém parado na porta de uma delas. É um rapaz, de longe parece estar com os braços abertos e pelo movimento irá correr em direção a mulher. É como se ele estivesse ansioso aguardando sua chegada.

Assim aquelas pessoas que se empolgam com este quadro, e que querem preservar no seu pensamento aquela cena, quando chegam fora do museu irão comprá-lo.

Eles se afastam depois de olhar o quadro.

Ali bem dentro da cena, a mulher sendo vista de costas por olhos que nunca a veriam de frente, está chorando; voltava para casa sim, mas estava estagnada; o artista criou os personagens, deu vida a eles, ao rapaz lá no fundo da casa, e a mulher na estrada. Mal sabia o artista como estavam sofrendo há tanto tempo, já que nunca iriam conseguir se encontrar; ele ansioso, com os braços estendidos, tentava correr sem, contudo, sair do lugar, ela chorando, pois, permanece também ali dentro daquela paisagem nostálgica sem poder se mover.

Os visitantes olham e admiram sem saber o sentimento que os dois vivem, estarem para sempre inseridos dentro de uma obra fadada a simplesmente permanecer no exato momento em que foram criados, colocados longe um do outro, assim destinados a ficar para sempre sem ação.

Talvez também sofram todos os outros personagens inseridos em todas as obras de arte.


Criado por Lavínia Ruby em 13/12/10. mariegracev

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