28 de setembro de 2021

Sala de Visitas

Sala de Visitas - Por L. R.



Na sala quadrada, as paredes nas cores brancas e azulada. Havia um sofá coberto com uma manta amarela e azul, uma mesinha de centro sempre com uma toalhinha de crochê sob um vaso de flores silvestres. Uma grande janela portava um cortinado de renda branca. Uma porta enorme azul dava saída para um alpendre. Outra porta dava para a sala de jantar, e uma escadinha de cinco degraus descia até a porta da rua. Assim era a salinha de visitas, palco de algumas lembranças de Alba.


_Alba! Por que você não vem até aqui para conversar com o vovô? Como é acanhada essa menina, Saulo.

_É, papai. Parece até que nasceu na roça. Perfeito bicho do mato.

_Venha cá, Alba!

_Fugiu!


_Vovó Sinhá, conte uma história para mim?

_Senta aqui no sofá da salinha de visitas que eu contarei para você, Alan.

_Sabe que havia um rio muito grande e um menininho como você que gostava de brincar de jogar pedras?


_Pois é, mamãe! Alan é bem diferente. Desembaraçado até demais.

_Pois sabe, Vilma? Sempre falo sobre isso com Leila. Os meus filhos que mudaram para a cidade estão todos reclamando dos meus netos homens, dizem que estão impossíveis. É a modernidade.


_Bença tia! Cuidado, com a escada, tia! Vô chamá mamãe.

_Deus te abençoe, Alba! Como você está crescendo, hein? Perdeu até os dentinhos da frente.

_Dei para o bem-te-vi, tia.

_Chame sua mãe!

_Está bem, tia!

_MÃÃÃE!

_Leila, como vai? Que saudade! Como vão todos lá na roça? Por que não vieram?

_Estão ocupados com a panha do café. Só veio mesmo me trazer, o Rui, que foi ao dentista e depois virá me pegar.


_Olá, Vera! Entre!

_Está bem, Alba!

_Logo, logo estarei pronta. Hoje deve estar bem animada a avenida.

_ Sabe quem eu vi? O Henzo.

_Puxa, ele voltou? Então você deve estar feliz,Vera.

_Sim, mas ouvi dizer que está namorando a Margareth.

_Esses rapazes! E ela namora todo mundo... Bem, já volto!


_Estou lavando esses degraus. Cuidado, não vais patinar e cair, papai.

_Por que você sempre tem que estar lavando essa entrada? Já está limpa.

_Olhe papai, foi a mamãe foi quem mandou.

_ E onde está o meu jornal que estava em cima dessa mesinha. Onde foi parar? Sabe, que eu não gosto que tirem minhas coisas do lugar...

_ Alan pegou para fazer chapéu de soldado.

_Alba, por que você permitiu? Essas crianças me deixam louco.

_ E pare de gastar água desse jeito.VILMA! PRECISA DAR UM JEITO NESSES TEUS FILHOS!

_Calma, Saulo, Como andas nervoso!


_ Onde está o Alan, Alba?

_ Saiu com um amigo da escola, papai.

_Qual amigo, Alba?

_Acho que o nome dele é Fred.

_ Ah! É o filho mais velho do Alfredo do armazém. Trabalhador esse garoto, já ajuda o pai. Alan precisa fazer o mesmo. Ir na fazenda de vez em quando para aprender a lida.


_Sente-se, tia Júlia! Logo, logo, mamãe já vem.

_Pode ficar tranquila, Alba! Vou descansar. Vá, vá cuidar do que estava fazendo. Esperarei sua mãe.

_Estava estudando para o Vestibular. Decidi fazer Pedagogia.

_ Que bom Alba! Você leva muito jeito para lidar com crianças. Terá muitos filhos, com certeza.

_Que é isso tia? Nem namorado eu tenho.


_Sente-se, Vera! Deixe ver se ninguém está ouvindo! Gosto do Fred, mas ele não sabe.

_Fale para ele.

_ Não, não, eu não consigo.

_ Eu falarei então.

_ Não amiga, se você fizer isso, não lhe perdoarei. Fica só entre nós.


_Suba, Fred! Pode subir que eu já venho! Vou pegar o trabalho de Sociologia e você dá uma olhada.

_Alan, depois quero que você me conte se está paquerando mesmo a Elenice. Bonita ela, hein meu chapa?

_Ora, Fred, só amizade. Ela não está interessada em mim, mas em você.

_Ora, deixa disso! Ela dá bola para todos. É muito convencida.

_ Bem, mas ela está atrás de você. Todos sabem.

_ Qual! E sua irmã, Alba? Onde está? Quero falar com ela.

_ Acho que está fazendo correções de lições, lá no quarto. Conseguiu pegar algumas aulas. O que quer com minha irmã? Não quero brincadeiras com ela.

_ Você sabe que gosto muito dela, mas ela parece ter medo de mim.

_Ela é muito tímida. Tem que ter paciência com ela. Mas por que então está perguntando da Elenice?


_Alba, ainda não tem namorado?

_Pare Celina! Vai deixá-la sem jeito. Olha, acho que ouviu nossa conversa.

_Oi Celina, está falando de mim? É realmente, eu não tenho namorado.

_ Mas ela gosta de alguém que agora nem olha mais para ela.

_É? Quem será...

_Ora, Celina, você não sabe de quem a Alba gosta?

_Pára com isso, Vera! Fale de você. Está mesmo namorando o Henzo?

_ E vai ficar noiva.

_ Verdade, Vera? Fico contente por você.

_Celina fala demais, mas é verdade. Vamos casar e morar na capital onde Henzo está trabalhando.


_Papai, senta aí. Preciso falar com o senhor. Estou muito apaixonado por Nancy. Decidimos nos casar. Já terminei os estudos, estou trabalhando na fazenda, tenho algum dinheiro.

_ Bem, filho! Já estava na hora! É bom não ficar muito tempo enrolando a moça, e além do mais é de boa família e muito boazinha.

_Também gosto muito dela, Alan.

_ Ó mãe, que bom! Espero que Alba também aprove.

_ Claro, Alan! Ela é bem sincera e vai fazer você feliz, tenho certeza.


_Olá, Vera!

_ Então, é verdade? Ele está namorando a Elenice?

_Sim, Alba! Disseram que Fred está louco por ela. Ele está trabalhando agora como secretário no escritório de contabilidade do pai dela. Arranjo dela. Só para ficar perto dele. Seus pais são muito amigos. Tem negócios juntos. Aprovam o namoro.


_Oi Vera! Que bom que você veio. Ele esteve aqui, estava parecendo interessado em mim, mas eu fui bem indiferente. Ele ainda está com Elenice, deve gostar mesmo dela.

_Pelo menos ela não o deixa em paz. Fala para ele. Você fica escondendo que o ama. Deixe de orgulho. Vai perdê-lo.


_Alba, fui ver a Eloá.

_Mamãe, sente-se, porque não me chamou? Olhe como está cansada. Como está ela?

_Triste. Só o pai é que aprova o casamento, mas por causa dos negócios; e Fred vai se casar mesmo com Elenice. Agora está preocupada com a felicidade dele. Vai morar longe daqui. Eloá vai sentir muita falta do filho. Ela perguntou por você, Alba. Bem, vou descansar um pouco aqui no sofá. Filha traga um pouco d’água.

_Estão batendo! É o senhor? Sr. Jonas, o papai já vem. Sente-se! Tudo bem com dona Beth?

_Sim, Alba! E você, como vai?

_Bem, senhor! Quer um café, um copo d’água?

_Sim, aceito!

_Olá, Sr.Jonas! Então aceito nesses termos e podemos fechar o negócio no cartório.

_Então está decidido.

_Venha aqui, Vilma! Compraremos as terras.

_ Que ótimo! Diga para a Beth que irei fazer-lhe uma visita.

_Direi. Ela sente sua falta. Gosta de conversar com a comadre.

_Obrigado pelo café. Está muito bom, Alba!

_Alba é muito prendada; pena que até agora não decidiu namorar.


_Oi, Alba, tudo bem?

_Oi, Vera! Que surpresa! Estava com muitas saudades suas. Vamos entrar! Como vai indo sua mãe?

_ Está bem de saúde. Só que tem tantos afazeres que quase não sai mais de casa. E você? Conta-me o que anda fazendo. Como vai sua vida? Trabalhando?

_Estou dando aulas. Acabei a faculdade e agora estou como substituta em uma escola rural. E você, Vera? Como está a vida de casada?

_ Estou bem feliz, com saudades de nossas conversas, amiga. Eu estava sempre pensando em arrumar trabalho fora daqui, mas meus pais não queriam que eu saísse. Pois é! Agora me casei e fui morar longe. Arrumei um emprego em uma boa empresa e quase não posso vir mais aqui.


_É uma notícia triste que eu trouxe, Sr. Saulo. Infelizmente Januário faleceu. Acidente com o trator.

_Vamos depressa! Vilma procure se acalmar. Alba cuide de sua mãe.

_Sente-se aqui, mamãe!

_Alan, chame o dr. Américo, agora. Vá depressa!

_Coitado de Januário, Alba! Sempre tão cuidadoso. Como foi acontecer isso? Seu pai vai precisar muito do Alan. Já está tão nervoso.


_Vera! Que bom ver você! Quanto tempo você não aparece. Entre, Vera. Sente-se!

_Alba, sabia que você estava morando aqui ainda e resolvi passar para vê-la. Matar a saudade dos velhos tempos.

_Pois é, Vera! Minha vida sempre igual.

_E o Fred?

_De novo ele? Fred se casou, mudou-se para outra cidade. Não quero falar dele...

_Seu grande amor casou? Com aquela Elenice? Não acredito!

_Quieta, ninguém fala mais nisso, só o Alan. Bem, agora tanto faz, não quero mais ninguém. Mamãe ficou só para cuidar de papai que adoeceu. Trabalhou muito na fazenda. Alan também está lá, assumiu o seu lugar. Estou lecionando ainda e ajudando em casa. Quase não saio mais.


_Oi, mana velha! Precisa se casar, o tempo está passando. Suas amigas já se foram.

_Pare, mano! Estou bem assim.

_Está nada! Ele já era. Está longe. Com a Elenice. Perdeste sua melhor amiga e eu meu melhor amigo.


_Oi, Alan! Oi, Nancy! Onde está o Natanael?

_Está com mamãe. Mas já vem aí.

_E o coraçãozinho partido, como vai?

_Pare, Alan, cuide de sua vida.

_“Eu nunca mais vou te esquecer, meu amor...”

_Chega, Alan!


_Não suba correndo essas escadas, Natanael. Você pode se machucar.

_Pare com isso. Alba! Deixe seu sobrinho fazer o que quer, ele está na casa da avó.

_Senta aí no sofá e vê se não suja de doce, vai melar tudo aí. Educação filho, viu?

_Tia, quer pirulito? É de chocolate.

_Está bem, um chupadela só, Natanaelzinho.

_Sabe, mana, quem se divorciou? O Fred! Já faz cinco anos. Seu casamento foi um desastre. Agora voltou e vai ficar na cidade, Alba. Diz que vem aqui. Está com saudades de seus doces. Não precisa ficar brava, e nem vermelha. Olha, por que não lhe diz finalmente que gosta dele?

_Saia daqui, Alan! Não me amole.


_Oi, Fred! Entre! Sente-se aí! Vou lhe mostrar o meu site.

_Está bem, Alan. E a Alba, como está? Sabe porque eu vim. Não sabe? Será que ela me perdoa.

_Se perdoa? Você não merece perdão. Sei que ela sofreu todo esse tempo. Só que finge muito bem. Anda muito abatida e muito cansada pelo trabalho fora e em casa. Vou chamá-la, enquanto ligo o computador você conversa com ela, se ela quiser, a tonta.


_Oi, como vai, Fred?

_Estava com saudades de você. Estás bonita. Alba! Queria muito conversar a sós com você em outro lugar. Tenho muita coisa para lhe falar. Por favor! Você sabe que não deu certo meu casamento, foi um erro. Vou voltar a trabalhar com meu pai aqui no armazém, ele precisa de mim, está velho e não pode ficar sozinho.

_Olha, Alan está te chamando no quarto.

_Já vou! Alba quero conversar urgente com você. Prometa! Hoje à noite venho aqui. Vamos sair e dar uma volta na praça. Não aceito não como resposta.


Alba está sentada no velho sofá, seus olhos se enchem de lágrimas que não conseguem mais serem contidas, enxuga seu rosto na beirada do seu velho e antigo vestido. Depois olha pela porta da sala. Lá bem em frente no quarto de Alan, está o seu amado, olhando para ela, sorrindo. Ela fica desconcertada, mas descobre um brilho diferente em seus olhos. Com certeza é o amor. Para ele também sorri então, esperançosa, lá da sala de visitas.



Escrito por Lavínia Ruby em 31/05/11. mariegracev


Nenhum comentário:

Postar um comentário