28 de setembro de 2021

Seguindo Seus Passos

 

Seguindo Seus Passos - Por L.R.



William estava sentado confortavelmente em seu camarim. Escrevera várias peças que ficaram em cartaz por muito tempo, que foram apresentadas em várias capitais, tinham-lhe satisfeito o seu ego, enchido os seus bolsos e também dos artistas que havia escolhido para formarem o elenco.

Ele era diretor de teatro há tempos, tinha quarenta e nove anos de idade, solteiro, muito bonito, moreno, olhos azuis, barba por fazer, vestia-se descontraidamente com calças jeans, colete por cima da camisa de mangas arregaçadas, sapatos mocassim, cabelos compridos presos atrás. Era uma pessoa que não queria compromisso sério com nenhuma mulher. O teatro era sua paixão.

Era tarde. Já fazia algum tempo que os artistas haviam saído depois da apresentação do espetáculo em cartaz “Traição Não É Pecado”, e ele, agora, estava terminando de rascunhar sobre um tema um pouco diferente dos relacionados ao amor, divórcio, ciúme, sexo, que ele habitualmente fazia e que como eram extremamente “quentes”, eram muito apreciados pelo público frequentador de teatro.

Mais ou menos assim a história: a dedicação de um médico pela sua profissão fazia com que este atendesse pessoas humildes sem se preocupar se pagariam ou não, assim se envolveu emocionalmente com uma mocinha simples, depois mais tarde descobre que o jovem aidético que atendia em seu consultório era seu filho.

Bateram à porta e ele perguntou:

_ Quem é?

_ Sou Francisco. Era o rapaz que ajudava na montagem e desmontagem dos cenários.

_ Entre Francisco! Está tudo em ordem?

_ Sim, Sr. William! Tudo no lugar.

_ Então, sente-se aqui! Está com um tempo ainda?

_ Sim, Sr!

_ Gostaria então que me ouvisse. Vou montar um novo espetáculo. Vou fazer dessa vez uma coisa diferente. A peça é sobre pessoas humildes. Não terá suntuosidade, nem iremos trabalhar com material e figurinos caros. Os personagens? Gente comum: um médico, o ator principal; um padre; uma jovem atriz: mulher sofrida; uma criança, não, um adolescente viciado em drogas que contrai o vírus da AIDS. Isto! Três crianças pequenas; o marido vagabundo, alcoólatra e figurantes. Faremos quatro cenários. O primeiro, será de uma vila com uma igreja, o segundo de um quarto pobre, o terceiro de um hospital, e o último de uma ruela mal iluminada! Bem, o quarto novamente, a igreja, o hospital. Certo! Aqui estão os esboços. Iremos começar a confecção desses cenários amanhã. Ajude Mário, pois ele com certeza terá que se apressar. Pretendo distribuir os papéis também, o mais tardar até o fim dessa temporada. Bem! Estrearemos se tudo correr como previ até o fim do ano. É só. Pode ir!

_Ah! Lembrei que amanhã começarei a marcar testes com alguns atores jovens. Preciso de alguém para esse papel Não tenho nenhum que sirva, com essas características. Também me lembro que você um dia tomou o lugar de um ator. Isso me lembro bem. Você quer experimentar fazer um teste?

Francisco arregalou seus olhos azuis.

_Sim, Sr. William! Obrigada pela oportunidade! Se não conseguir certamente que irei ficar satisfeito também em ter confiado a montagem para mim.

No dia seguinte começaram os preparativos. Um aviso na porta do teatro para contratação de atores jovens. Apareceram vários para se inscreverem, pegarem as falas e marcarem seus testes.

A semana seguiu e William havia escolhido alguns estudantes de Artes Cênicas que desempenharam muito bem o papel que lhes era destinado.

William sentado na plateia com outros artistas, ficava muito satisfeito ao ver o interesse dos jovens pelo teatro.

Francisco não havia ainda se apresentado. Assistia ao fundo dos bastidores os outros se apresentando, estava inseguro, nunca havia estudado teatro, somente fizera o segundo grau, era humilde, pobre, lutava sustentando sua mãe, que há pouco perdera e lembrava da cena descrita pelo diretor, da mãe enferma e vinham lágrimas em seus olhos. Tanto que quando chegou a sua vez de interpretar uma pequena cena semelhante, fez com total perfeição que era como se a tivesse vivendo pessoalmente. A mãe enferma contando ao filho sobre seu passado e o caso que teria acontecido entre ela e o médico e a reação dele, as suas palavras entrecortadas pela descoberta da verdade sobre sua vida.

Francisco agradou William e os demais que estavam na plateia assistindo. Todos ficaram emocionados e foi admitido no elenco para aquele papel. Lógico que teria que estudar algumas técnicas, mas era inteligente, via-se que não teria dificuldades.

William e sua equipe começaram a preparar o espetáculo: “Seguindo Seus Passos”.

Nas horas que estava sem participar do ensaio, Francisco se envolvia na montagem dos cenários ajudando no que fosse possível, dando ideias e o seu entusiasmo era contagiante. Parecia que havia nascido para o teatro. A oportunidade que lhe haviam dado era o que faltava para desenvolver o seu talento nato.

William estava admirado de ter descoberto tão tarde aquele garoto humilde e que lhe despertava um sentimento que ele não havia descoberto até então. Depois da estreia da peça, que sem dúvida foi o maior sucesso, impecável a personificação dos atores, em especial do jovem estreante que comoveu o público no seu papel de portador do vírus da AIDS e que procurava a ajuda do pai

Francisco depois da comemoração saiu do teatro e encaminhou-se para o ponto de ônibus que costumava tomar para ir para casa.

William ao sair dali, também àquela hora, bem tarde, deparou com ele e ofereceu-lhe carona.

Francisco disse que não. William insistiu e dentro do carro, interessou-se pela sua vida. Sentiu-se penalizado ao vê-lo só.

Porém, Francisco estava feliz.

William perguntou-lhe de seus pais. Depois de hesitar em responder e de um silêncio que resultou em lágrimas naqueles olhos azuis, ele disse que há três meses sua mãe morrera. Chamava-se Alice. Seu pai, ela dizia: era um ator de teatro que ela conheceu quando jovem e procurava trabalho.

Ele, William, lembrou-se que havia tido um sério caso de amor com uma jovem atriz com o apelido de Lily.


Criado por Lavínia Ruby em 25/05/10. mariegracev

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