Olá! Boa Noite! - Por L.R.
Eles se ensimesmavam olhando as estrelas no céu azul escuro da noite.
Não havia vestígios de que choveria embora um vento frio lhes causasse certo desconforto. As providências haviam sido tomadas, era necessário que ela viesse morar com eles devido ao seu estado de saúde, mas seria por certo um incômodo porque não era bem-vinda, nunca havia sido, embora o remorso às vezes causasse uma dorzinha funda em ambos. Os dois não suportavam aquela mulher mas concordavam que não podiam lavar suas mãos naquela hora e dizer que se dane; melhor morresse. Observavam a noite sossegada. Talvez não tivessem outra noite assim, e mesmo com a janela aberta da sacada aproveitaram para se amarem, mas havia certo clima no ar como se aquela presença já estivesse ali, suspensa, ao lado da cama observando-os.
Como seria proceder naturalmente, fingir que tudo estava bem entre eles, agir normal, com paciência, a partir de agora?
As palavras que seriam sufocadas na garganta, era o avesso dos gritos que a partir daquela noite seriam calados, quando antes soltavam contra ela as suas feras, que entre si mesmos, se acovardavam.
Agora, o silêncio seria o melhor remédio, talvez também o tratamento lhes permitissem um período menor de convivência, mas o que seria de suas próprias relações, seus ciúmes extremados um do outro?
Como ela pôde mandar aquele e-mail pedindo ajuda financeira para eles? Será que ela se negava a aceitar que eles não a suportavam e que não a ajudariam.
Porém, a decisão de ambos em auxiliá-la foi tão espontânea e imediata, olharam-se nos olhos não entendendo o que estava acontecendo com eles, sempre tão explosivos, mas não eram desumanos, ou eram? Assim, naquela noite, o coração de ambos também batia no mesmo compasso acelerado, aflitos.
A emoção ao olhar o tempo no relógio, a lua no céu, grande e amarelada, o frescor que vinha da vegetação próxima entrando no quarto depois do amor, produziu a esperança de que ela não viesse. Eles não teriam estrutura para esta presença constante entre eles, visto que ela era o impedimento para que eles não se suportassem em suas crises conjugais.
De repente, um soluço. Ela chorava. Uma angústia havia tomado conta e foi acima de suas forças.
De repente, um suspiro, ele saiu batendo a porta. Ela ficou desesperada, sabia que ele ia beber. Iria até o bar. Ela o chamou: ele não deu ouvidos. Ela ficou com medo de ser abandonada. Que a deixasse a mercê da situação. Que sufoco sentia. Ele era capaz de fazer isso?
Já havia antes escorraçado sua mãe. Não havia entre seu esposo e sua sogra qualquer simpatia e tolerância, mas todo obstáculo possível era criado para que não houvesse entendimento entre eles, inclusive provocações e insinuações que culminavam sempre em cenas desagradáveis.
"Não suportarei o abandono- suspirou- embora ele tenha todos os defeitos". Depois empenhada em armar outra briga resolveu verificar se ele havia mesmo ido ao bar da esquina.
Trocou-se e desceuas escadas resolvida a ir até lá. Quem sabe uma bebida juntos aliviaria a angústia e a insegurança que sentiam diante daquela situação que se apresentara então.
Assim que colocou a mão no trinco e abriu a porta, ela estava lá, parada, somente com uma bolsa na mão. Disse: Olá! Boa noite!
Verificou com surpresa que não havia mala alguma, mas um carro estava estacionado do outro lado da rua.
Antes que pudesse abrir a boca, ele chegou.
Havia assistido do bar a visita indesejada chegando, e rápido, largara a cerveja sobre o balcão e se apressara em voltar, quase barrando a sua entrada na casa. Porém, sua sogra o saudou com um sorriso e abraçou sua filha com carinho.
Sandra superou, abandonou os pensamentos maus que sempre a assolavam, principalmente durante aquele período de expectativa, e neste instante descobriu na simplicidade de sua mãe uma verdadeira sabedoria, a capacidade de lidar com situações que ela e seu marido irascíveis não eram capazes de resolver a dois, então afloravam neles doloroso embate, resultado de muita imaturidade. Este era o motivo de sua interferência e o poder dos conselhos que lhes repassava, apaziguava o casal nas horas difíceis, mas suportava inveja e os maiores desaforos.
Sua vontade era de pedir perdão para sua mãe como sempre havia demonstrado na sua infância e adolescência, através de desacatos à sua autoridade, nos momentos de raiva.
Olhava para a senhora magra e enrugada tão diferente de pouco tempo atrás. Sentiu pena. Convidaram-na finalmente a entrar. Depois sentaram-se. Ela discorreu sobre o câncer que a consumia. Mostrou tanta força, nenhuma lágrima derramada. Mas os dois sim, mudos, culpados, quando ela disse que viera se despedir, não iria permanecer na cidade, voltaria para a capital e procuraria tratamento lá, seria melhor para eles. Abriu a bolsa, devolveu-lhes o cheque que não necessitaria... conseguira enfim vender sua casa, pois, não pretendia voltar, mesmo que ainda estivesse esperança de cura.
Nenhum deles insistiu para que ficasse ou que pelo menos aceitasse o dinheiro.
Estavam tão aliviados e ao mesmo tempo tão desarmados que parecia até que suas roupas estavam no chão. Nus de sentimentos, de qualquer sentimento. Ela ergueu-se da poltrona em que estava sentada. Levantaram-se também os dois.
Abraçou ambos.
Pediu-lhes perdão pela intromissão em suas vidas. Disse-lhes que sempre fora bem intencionada, preocupada pela felicidade deles, pois, sabia que se amavam.
Se comunicariam.
Caminhou sozinha até a porta. Entrou no carro.
Deixou para eles um vazio muito grande. Ambos pensaram: "Era bem melhor estar Com ela".
A pergunta era: "Subsistirá o nosso casamento Sem ela?
Escrito
por Lavínia Ruby em 13/04/2018. mariegracev

Nenhum comentário:
Postar um comentário