28 de setembro de 2021

O que era preciso

 

O que era preciso - Por L.R.


Em seu moderno escritório onde tranquilamente coordena suas empresas e ganha rios de dinheiro, ele se encontra enfastiado em sua poltrona, com um ar ausente, espírito vagando. Não consegue nem mesmo pensar em mulher, está farto de transas e já curtiu de tudo o que seu dinheiro poderia comprar.

Deitada em sua cama luxuosa, com os catálogos de viagem espalhados sobre o edredom macio de veludo azul, observa displicentemente os lugares que já visitara e uma interrogação em sua testa se desenha. Aonde ir agora? Já viajou por todo o mundo, visitou todas as ruínas famosas, todos os museus, já esteve presente em todas as festas badaladas, conheceu tantas e tantas celebridades, já viveu grandes amores. Aquela ilhazinha... Valerá a pena? Que encontraria lá? Será que não seria tédio? Um passeio igual a qualquer outro?

Sentado introspectivo em sua cadeira defronte a uma mesinha cheia de livros, analisando cada pormenor dos estudos científicos que faz; pesquisador de História e procurando esclarecimentos para justificar certos comportamentos, se entretém, de repente, com artigos sobre a mente humana, sobre expansão de sentimentos e sentimentos enterrados; começa a meditar sobre isso tudo. Devo sair daqui! É urgente que eu faça minha pesquisa lá fora, uma força me impele.

_Sim. Lá eu poderia descansar um pouco também. Dizem esses contratos que eu devo ir a esse encontro e resolver tais negócios pessoalmente. Devo marcar com meu secretário e ele me acompanhará. Mas será que ele mesmo não pode resolver? Mas eu preciso ir. Creio que é melhor. Bora Bora. Sinto que me fará bem.

_É esse o lugar. Bora Bora. Que farei por lá? Encontrarei mais amores? Com certeza. Aqui diz que se divertem a beça por lá, sem o mínimo de constrangimento. É o que ela me proporcionaria. Uma ilha minúscula e paradisíaca no Oceano Pacífico. Mais ou menos nove mil habitantes. Hotéis...hotéis...Muitos Resorts. Lagunas, outras ilhas próximas. Bem, é para lá que vou. Mas por que me atrai tanto? Já estive em tantos lugares semelhantes.

_Sinto uma necessidade grande de localizar um lugar propício Por quê? Não sei. Sinto-me infeliz aqui. Parece-me que é lá que estarão as minhas respostas. Farei um bom trabalho. Irei sim. Sairei desse ambiente. Aqui diz que para ter sucesso nesse estudo devo me inserir no meio, dele fazer parte, e então poderei finalizar minhas pesquisas. Seria esse aqui o lugar adequado? Bora Bora. É, nativos polinésios. Como vivem no meio de tantos turistas? Bem, gastarei todas as minhas economias, afinal deverá valer a pena, nunca fiz antes uma viagem unindo o útil ao agradável.

Um jatinho particular. Dois passageiros. O empresário, o secretário.

Um aeroporto. Um voo; uma passageira de primeira classe. Outro voo; um professor- passageiro da classe econômica. Mesmo destino: Bora Bora- dificuldades para chegar, transportes por barcos até a ilha. Muitos turistas, todos endinheirados, empresários, pesquisadores, esportistas...

A pequena ilha no oceano.

O entusiasmo da chegada, os risos alegres, o deslumbramento com a natureza.

_Vamos direto para o hotel. Que descaramento desses casais!

_ Senhor! O encontro está marcado para as catorze horas no Club do Hotel.

_Fecharemos rapidamente esse acordo...

_... que lhe renderá milhões de dólares, senhor!

_Depois quero andar sozinho por aí. Conhecer a solidão da ilha. Não aguento mais tanto falatório, tanta expansão, tanta indiscrição. Quero é sossego. Estou cansado desse tipo de relacionamento.

_Mais alguma coisa, senhorita?

_Pode ir! Descansarei um pouco. Tomarei uma ducha. Também gostaria de almoçar em meu quarto, por favor!

_Por que estou trêmula? Colocarei esse vestido velho. Por que o trouxe? Depois caminharei na solidão da ilha. Não sei se fiz bem em vir sozinha, todos esses rapazes me “comendo” com os olhos.

_Creio que aqui entre esses habitantes desenvolverei melhor a minha tese. Gente que aqui nasceu, sempre viveu, conviveu, sem nunca terem se desligado. Vida restrita, mas importantes relacionamentos desses nativos seguros, íntimos, laços afetivos que não são quebrados. Sim, melhor viver na solidão da ilha, tão isolada do resto do mundo, mas todos unidos como uma grande família, ninguém solitário como eu. Mas será como conseguem conviver com tantos turistas sem alterar seus hábitos? Depois mais tarde irei pensar mais a fundo sobre isso. Darei um passeio por aí.

A praia, o rochedo, um rapaz com olhar triste olhando o oceano imenso que o separa de tudo o que vive.

Um vulto de mulher cheia de saudades e recordações do que antes havia sido, usando um velho vestido, banha os pés na água azul, próxima ao rochedo.

Um homem angustiado, ansioso e com ar ausente se aproximando, andando descalço sobre a areia quente.

O acaso.

Cada um volta seu rosto um para o outro. Aproximando-se lentamente vão se encontrar onde as ondas avançam e lambem seus pés. Pelos olhares se reconhecem. O rapaz dá risadas e grita, a mulher chora e ao mesmo tempo ri e o homem não se sustenta e se ajoelha. Os braços se estendem para um abraço de irmãos.

Quanto anos haviam passado durante os quais viveram intensamente seus sonhos, suas vidas, mas faltava para eles o que era preciso, a convivência fraterna para serem felizes.

Escrito por Lavínia Ruby em 19/08/2013. mariegracev





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