27 de setembro de 2021

Mulheres e Escolhas

Mulheres e Escolhas - Por L.R.

 

É 5ª. feira. Bem de manhãzinha.

_ Por que você não namora o Dario? Ele é tão bonito! Parece gostar de você!

_ Gosto dele, mamãe, mas prefiro continuar solteira. Quero casar com um homem rico.

Assim fala Isabel, filha mais velha da dona da barraca do pastel.


Poucas barracas armadas. E ele está lá. Levanta bem cedinho, carrega a caminhonete com todas as tábuas necessárias: os cavaletes, a lona, os caixotes com as verduras e as frutas, e com seu filho de dezessete anos que o ajuda colocando-as empilhadas na carroceria de modo que não possa estragá-las, sai do seu pequeno sítio, se dirige para o local indicado pela Prefeitura. Duas vezes por semana eles não vêm, esses dias tiram para descansar das vendas, mas trabalham lá, cuidando da horta e do pomar.

Na feira, o movimento das pessoas nesta hora da manhã é intenso. Elas preferem levantar bem cedinho para encontrar coisas frescas e evitar as escolhidas demais que ficam para a xepa.

Dario é um homem de trinta e nove anos, simples, trabalhador, atraente, moreno bronzeado, cabelos lisos, atlético. Seu filho Natanael é órfão de mãe e Dario ficou viúvo aos vinte e dois anos com ele para criar.

Sua mulher faleceu quando deu a luz. Havia se apaixonado por ela desde adolescente na escolinha rural, sendo sua vizinha, morando num sítio ali perto. Seus sogros cuidaram do pequeno, mas depois de um tempo ele não queria mais largar do pai, aonde ele ia estava atrás, então veio morar com Dario e sua mãe, que já idosa e doente faleceu pouco tempo depois.

Dario tem o maior amor por ele, lhe ensinou a tomar conta do sítio, das aves, do pomar, da horta, mas faz questão também que ele estude. Com sacrifício, lhe paga Escola Particular na cidade, e ele faz o Segundo Grau à noite, tomando o ônibus escolar todos os dias. Assim vão levando a vida os dois.

Dario agora está montando sua barraca. Natanael o está ajudando. Os fregueses já estão chegando. Há muita gente, é necessário atender rápido. Ajudar a pesar, responder às perguntas, ser gentil, lidar com o dinheiro da venda, colocar na sacolinha a compra.

Sempre aparecem fregueses agradáveis conhecidos há tempos. As donas Marias e os Josés, nomes que costumam chamar a todos.

Natanael hoje está preocupado, as provas estão chegando. Vai terminar seus estudos e prestar vestibular. Deve se dedicar muito mais. Nem irá para o sítio. Irá rever a matéria para a prova do ENEM. Com certeza garantirá uma vaga. Pretende ser engenheiro agrônomo.

Assim termina mais um dia e Dario desta vez voltará para casa sozinho. Deverá primeiro levar Natanael a escola. Estão colocando tudo na caminhonete. Natanael tira seu avental e se prepara para a escola enquanto Dario dirige até o centro onde Natanael.


Vai estacionar ao lado do Instituto porque não tem como passar em frente tal o movimento, quando um carro Ford Fusion lhe dá uma fechada e lhe toma o lugar esbarrando na lateral da caminhonete.

Ele fala um palavrão alto e Natanael diz:

_ Pai, é minha professora de Biologia.

A mulher desce do carro, e chega até ele para pedir desculpas.

Dario também desce, olha o estrago e diz que não foi nada. Natanael apresenta seu pai, que está todo sujo e se envergonha de estar assim. Limpa as mãos no avental, diz que não dá para cumprimentar.

Vilma, bem simpática, de quarenta e três anos, solteira ainda, pensa: Como é bonito e forte esse feirante! Apaixona-se à primeira vista. Dario também a olha com desejo de alto a baixo e ela se sente despida. Natanael sente o clima e sorri. Eles não conseguem manter diálogo algum. Não sabem o que dizer, a não ser:

_ Bem, o sinal soou! É melhor entrarmos.

_ Até logo! Prazer! diz Dario, olhando-a por trás enquanto ela caminha sabendo-se observada, e ao chegar ao portão Natanael acena para o pai e diz malicioso.

Venha me buscar hoje a noite pai, às oito horas.

Vilma vira e encontra os olhos escuros sob as sobrancelhas cerradas e o sorriso franco nos lábios entreabertos de Dario.

A noite ele volta a escola, mas infelizmente não encontra a professora.

Mas ela o observa pela janela de uma classe com uma vontade louca de sair naquele instante. Nota que ele dá um tempo ali na porta depois vai embora.


Natanael sente que seu pai está pensativo, chateado. Sabe que o motivo é a paixão.

Então conversa com ele.

_ Pai, a professora é solteira. Por que o Sr. não vem me buscar todos os dias? Pelo jeito que ela te olhou pode dar certo. Pode convidá-la para sair.

_ Filho, eu gostei dela. Mas não tenho esperanças não. Ela não vai ter coragem de sair com um feirante. Um cara simples, sitiante que não tem estudo. É melhor esquecer. Estou gostando dela, parecia que ela havia se interessado, mas está me evitando. Fui só um flerte para ela.


Em casa de seus pais, gente de posses, Vilma está se abrindo com a mãe, pedindo conselho, depois de pensar muito em Dario.

_ Conheci um moço, mãe. Seu nome é Dario, é viúvo. Estou gostando muito dele. E contou para ela sobre o encontro. É pai de Natanael, meu aluno da preparação para o cursinho. Ótimo garoto! Não sabia de nada sobre sua vida, porém estive me informando. Tem trinta e nove anos. Tem um sítio, é feirante, não tem estudo só o primeiro grau.

A mãe:

_ Filha, esquece, não dará certo. Você, uma professora de Faculdade, pós - graduada. Como irá apresentar seu marido, um feirante? Tem que namorar alguém de seu nível.


_ Olhe, mãe! Estou com quarenta e três anos. Sempre que gostava de alguém fazia essa comparação. Acabei ficando sozinha de tanto pensar nisso.

_ Bem filha, dizem que “quem pensa muito não casa.” _Mas um feirante, sem estudo, é demais! Arrisque então se está apaixonada, mas não conte com meu apoio.


Vilma , pensou, pensou e mais uma vez enterrou sua paixão por causa de seu orgulho e preconceito tal qual a pobre, ambiciosa, também orgulhosa e preconceituosa Isabel, a filha mais velha da dona da barraca do pastel.


Criado por Lavínia Ruby em 28/05/10. mariegracev


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