Reminiscências - Por L.R.
A mesa com tampa de vidro com várias fotos debaixo, alguns recados, anotações, calendário, um santinho e sobre ela um suporte de papéis, caixa de canetas, lápis, régua e uma pilha de cadernos para corrigir,epapéis empilhados para recortes; livros em um canto, esperavam para serem novamente pesquisados.
Não havia mais ninguém, todos haviam ido embora e ela ficou só com as mãos sobre a mesa, abandonado o lápis que estava quase sem ponta, um caderno aberto cheio de certo e errado, folha ao lado de anotações e livro de diário de classe para passar as notas que já estavam em um rascunho ao lado e esperavam sua decisão final. Estava frente àquele caderno onde se definiria a vida de mais um aluno e que agora era analisado em cada situação vivida durante aquele ano. Este havia sido um dos mais difíceis, com as crianças mais problemáticas que já haviam passado por suas mãos.
Conseguira com muito esforço, quase sobre - humano levantar todos os dias de manhã às seis horas, com o coração sobressaltado, trêmula e aceitar mais aquele desafio.
Era uma loucura estar sem condições físicas para manter aquela disciplina, de quarenta e três alunos durante cinco horas diárias, com a garganta seca e irritada, com hiperglicemia mal contida, com labirintite, com dores de estômago, pernas, cabeça, intestino preso, stress, sem poder faltar, justificar, abonar. Algumas vezes até que sim, mas e a classe, e a responsabilidade e as aulas?
Quantas vezes por dia ia até sua bolsa de professora rever o conteúdo da matéria, tão trabalhado e caprichado com todo amor que tinha pela profissão e ver se aquilo era o conveniente, o certo para seus alunos e queria que, quando chegasse à sala, eles o olhassem e assimilassem com amor, atenção e interesse e, sobretudo aprendessem, fossem amigos, companheiros, apresentassem uma mudança substancial na maneira de ser e desenvolver conhecimento.
Procurava atraí-los da melhor maneira possível, contanto nos intervalos das aulas, fatos interessantes que se entrosavam com o material estudado e assim ao longo de todo aquele ano intenso, o resultado fora bem melhor do que esperava.
Estava no fim, analisara cada aluno um a um, reforçara como pode, individualmente, mas ficara decepcionada, pois, esperava ter mais tempo para alguns, mas a burocracia e leis impediam de se trabalhar como devia, com quantos precisavam mais, qual o tempo que lhes poderia ser destinado, e com isso a sensação sempre de estar em dívida.
Porém, as crianças não sabiam disso, para eles, o tempo? Tanto faz! O que queria a maioria era o disponível, sem compromisso com estudo, para ser aproveitado com divertimentos, fora das quatro paredes da sala.
E ela, com o caderno aberto, e analisando o que Joelzinho tinha feito, ou melhor, deixado de fazer durante o ano, pesou na balança seus erros e acertos e viu que seria melhor reprová-lo.
Mas quando viu sua carinha aparecer espiando pelo vidro da janela e gritando:
_Professora!...
Ela se rendeu e escreveu no canhoto de notas: Suficiente.
Criado por Lavínia Ruby em 25/03/10. mariegracev

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